A categoria cuidado é central na teoria feminista da deficiência. Ainda assim, enquanto um termo êmico e também analítico, o cuidado tem sido objeto de controvérsias entre teóricas e ativistas do campo da deficiência. No presente trabalho, pretendemos traçar a trajetória desta categoria dentro do movimento social e das teorias que embasam o modelo social da deficiência, a fim de apontar os conflitos que permeiam este diálogo. A abordagem parte de pesquisas realizadas em Porto Alegre e Belo Horizonte, Brasil, respectivamente junto a mães/cuidadoras de adultos com deficiência cognitiva e a mulheres com deficiência física com histórico de violências, bem como a fontes secundárias. Problematizaremos quatro aproximações comumente acionadas no cotidiano de nossas(os) interlocutoras(es) – o cuidado como “superproteção”, o cuidado como “educar” e o cuidado como “violência” – por entendermos que elas proporcionam uma reflexão teórica em torno da polarização entre os conceitos “cuidado”, “autonomia” e “independência”. Refletiremos, a partir das teorias feministas do cuidado, em especial a obra da filósofa Eva Feder Kittay, o cuidado não apenas enquanto uma prática social e emocional e uma categoria moral sob a qual incide múltiplas valorações, mas também uma “entrada etnográfica” para refletirmos sobre os modos como a deficiência é coproduzida no cotidiano de nossas(os) interlocutoras(es), permitindo-nos uma melhor compreensão acerca da experiência da deficiência em si.