por Débora Diniz
Publicado originalmente em HUFFPOST BRASIL
Um crime horrível ocorreu em Brasília. Um bando de adolescentes e um jovem adulto estupraram uma menina de 11 anos. Filmaram o horror como se fosse um espetáculo. Se filmaram é porque há audiência – gente que precisa ver para crer que há barbárie contra mulheres e meninas. Ou gente que gosta de exercitar o olhar para o sofrimento dos outros.
Não sei bem a razão, se perversidade ou naturalização cultural da violência contra as mulheres. O estupro é um crime que despossui as mulheres, uma espoliação da existência pelo sexo.
Muitas mulheres e homens gritam frases para expressar o espanto por um crime tão bárbaro – “nenhuma mulher merece ser estuprada”, “homens são violentadores de mulheres”, “o estupro é um crime de gênero”, “pelo fim da cultura do estupro”.
As frases são palavras, quase fórmulas, para falar de um sentimento de indignação sobre o sem-sentido de um crime como esse. Quando vivemos um evento traumático – e mesmo como testemunha da história apenas – é que sentimos o quanto a linguagem é frágil para expressar nossos afetos.
As frases são formas de nos representar e contra-provocar os que não se espantam com histórias como a da menininha de 11 anos estuprada por um bando.
O curioso da circulação dessas frases é que há gente mais preocupada com os sentidos plenos de cada palavra do que mesmo com o evento que as motivou.
Esquecem-se de que são frases-fórmulas, repito – tentativas de representar dores e angústias – e passam a discutir representatividades semânticas. São abundantes os homens (algumas mulheres também, é verdade) que passam mais tempo a implicar com o universal “os homens” que mesmo em imaginar as dores e os medos vividos pela vítima. Talvez, valesse explicar algo aqui.
Se você é um homem civilizado, daquele que jamais irá violentar uma menina de 11 anos; ou, se ao menos é um homem bacana, daquele que jamais irá dar uma cantada em uma mulher na rua ou desrespeitá-la simplesmente porque é mulher, por que se indignar com algo que não o representa ou não o tem como destinatário?
A palavra “homem” é um substantivo genérico que fala de uma sexagem ampla. Sei que pode haver um tom agressivo na palavra, mas como ter uma mensagem eficiente e rápida?
E, cá entre nós, os estupradores são homens e as vítimas, mulheres.
Não vale sair contando uma história, singular e excepcional, de uma mulher que violentou um menino, ou de uma mulher que participou de uma violência contra outra mulher.
Há gênero no crime e no corpo do agressor: homens, estupradores; mulheres e meninas, vítimas.
Assim, eu pediria aos homens respeitadores e igualitários que não se ofendessem, mas se somassem à luta contra todas as formas de violência.
Uma delas é escutando o que é dito. Se não tiverem muito o que dizer para reverberar a mensagem certa, além do silêncio respeitoso, que não sejam vozes para discordar das mulheres pelo exercício de desdizer o que é dito com sofrimento.
Se não é sobre você que a mensagem fala, que tal nos ajudar a encontrar formas melhores de educar os homens, sensibilizar os meninos, ou mesmo, aprimorar mensagens?
Estou segura de que o foco não devem ser “os homens” ou “alguns homens” na frase que fala do horror, mas a menina de 11 anos violentada por um bando enfurecido.