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Entidades acionam o MPF contra ‘CPI do Aborto’ em Santa Catarina

Representação afirma que deputados querem criar insegurança e barrar acesso a direito previsto em lei

Por Mônica Bergamo/ Folha de S. Paulo

2 de agosto, 2022

Um grupo composto por cinco entidades dedicadas à defesa dos direitos reprodutivos acionou o Ministério Público Federal (MPF) pedindo providências contra a chamada “CPI do Aborto”, que deve ser instaurada pela Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) após as eleições deste ano.

O requerimento para a criação da comissão foi apresentado pela deputada estadual Ana Campagnolo (PL), apoiadora do presidente Jair Bolsonaro (PL). A parlamentar pede que seja investigado o caso da menina de 11 anos que, grávida após ser vítima de um estupro, foi induzida por uma juíza a desistir do aborto legal.

O caso foi revelado pelo The Intercept Brasil e pelo Portal Catarinas. Depois da repercussão, a menina realizou o procedimento de interrupção da gestação em junho deste ano.

Em ofício enviado à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e à Procuradoria da República em Santa Catarina, as autoras da representação afirmam que a abertura de uma CPI para investigar a menina e os profissionais envolvidos em seu caso é inconstitucional e permeado por ilegalidades.

“A pretensão dos parlamentares é criar insegurança jurídica em torno de um procedimento legal, produzindo diversas consequências negativas, como o afastamento de mulheres, meninas e pessoas com capacidade de gestar dos serviços de saúde”, diz a representação.

“O discurso dos parlamentares é claro: busca-se evitar que outras pessoas em situação de vulnerabilidade tenham acesso ao aborto legal”, segue o documento.

A iniciativa é subscrita pela clínica jurídica Cravinas, da Faculdade de Direito da UnB, pela Anis — Instituto de Bioética, pelo Coletivo Feminista de Sexualidade e Saúde, pelo Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular e pelo Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher.

No pedido de criação da CPI, a deputada Ana Campagnolo afirma que as situações que envolvem o aborto feito pela menina de 11 anos “merecem ser melhor esclarecidas”, como a reportagem que revelou o caso, se houve crime na realização da interrupção da gestação e se foi feita falsa comunicação do crime de estupro.

A representação das entidades junto ao MPF lembra, no entanto, que a parlamentar bolsonarista já acusou os profissionais de saúde envolvidos no caso de promoverem o “assasinato de uma criança”, assim como outros deputados da Alesc já se referiram ao procedimento como fruto de um “lobby abortista” e da “imprensa feminista”.

“As declarações dos deputados são centradas em afirmações moralizantes e sensacionalistas em torno do feto e do procedimento de aborto. Essa narrativa promove sentimentos de pânico em torno do direito ao aborto legal e incentiva a perseguição política de profissionais de saúde que cumpriram seus deveres legais”, dizem, ao MPF, as entidades que se opõem à instauração da CPI.

As signatárias da representação ainda afirmam que nada há a ser investigado pela CPI, uma vez que a menina de 11 anos acessou um direito previsto em lei, que a imprensa preservou sua identidade ao denunciar arbitrariedades cometidas por agentes do Judiciário e que os profissionais da saúde cumpriram seu dever legal.

Aos órgãos do Ministério Público Federal, as entidades pedem que “sejam tomadas as devidas providências ante as inconstitucionalidades e ilegalidades” do requerimento de abertura da CPI, como recomendações, ofícios e até mesmo ações judiciais.

“A tentativa dos parlamentares de instrumentalizar uma CPI para a promoção de discussões morais em torno do procedimento de aborto legal caracteriza-se como abuso de poder parlamentar, na medida em que, de forma injustificada, a CPI implicará na restrição de direitos fundamentais dos envolvidos nos fatos e criará uma situação de insegurança jurídica em torno do direito ao aborto legal”, diz a representação.

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