O tema não é simples, por isso vamos por passos: aumentou o número de casos registrados de recém-nascidos com microcefalia no país, especialmente na região nordeste. Microcefalia é uma má-formação cerebral que pode provocar problemas graves no desenvolvimento de crianças. Na tentativa de entender esse surto recente, autoridades de saúde levantaram a hipótese de que os casos estejam associados a infecções pelo vírus zika sofridas pelas mulheres grávidas. A doença, causada pelo vírus zika e transmitida pelo mesmo vetor da dengue, o mosquito Aedes aegypti, também é nova no Brasil. A relação entre o vírus zika e a microcefalia ainda precisa ser seriamente estudada, mas é nessa explicação que os agentes de saúde mais acreditam no momento.
Eis que o Ministério da Saúde se manifesta sobre medidas de prevenção: para evitar a microcefalia em bebês, mulheres deveriam não engravidar. O ministro Marcelo Castro declarou: “Sexo é para amador, gravidez é para profissional. A pessoa que vai engravidar precisa tomar os devidos cuidados. Ninguém deve engravidar ao acaso, deve ser feito um planejamento para uma maternidade responsável”. Em seguida, multiplicaram-se as notícias com manchetes de médicos recomendando que mulheres evitem engravidar.
Nós achamos que faltaram passos entre o problema e as recomendações de prevenção. Se um mosquito pode ser o causador do surto de microcefalia, por que a medida de prevenção não é – como no caso da dengue – eliminar o mosquito? Isso sem falar na hipocrisia de recomendar planejamento reprodutivo para as mulheres quando nossas decisões são restringidas por dificuldades de acesso a contraceptivos e pela criminalização do aborto. O Ministério da Saúde precisa decidir se quer controlar os mosquitos ou as mulheres. Nossa recomendação é clara: no surto de microcefalia, há dois inimigos a combater – o Aedes aegypti e o patriarcado.