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Passe livre e aborto. Veja o relatório da CPI do feminicídio no DF

13 de junho, 2021

Comissão já encerrada na CLDF elaborou série de recomendações para garantir a defesa das mulheres contra a violência física e sexual

Por Francisco Dutra
Publicado originalmente em Metrópoles

Assegurar o direito de escolha ao aborto legal é uma das recomendações do relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Feminicídio, da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF). O documento também sugere medidas como o reforço da rede de acolhimento e a oferta de passe livre para as mulheres vítimas de violência no DF.

Segundo o relator da CPI do Feminicídio, deputado distrital Fábio Felix (PSol), apesar de o aborto legal já estar previsto em lei, a rede pública do DF sofre com a precarização do serviço. O tratamento conta apenas com uma psicóloga e duas ginecologistas dispostas a fazer o procedimento.

“Vários funcionários se negam a atender”, disse o deputado. Felix também declara que é preciso combater a cultura de culpar a vítima. “Tem um cartaz na porta do serviço dizendo que se a mulher mentir sobre o que está acontecendo é crime. Ou seja, é para fazer a mulher se sentir acuada em dizer que foi vítima de violência”, alertou.

Para o parlamentar, é preciso humanizar o serviço. “Imagina. Para a mulher chegar dizendo que foi vítima de violência, ela já chega muito machucada”, comentou. Nessa linha, o relatório defende a aprovação do Projeto de Lei 404 de 2019, produzido por Felix antes da CPI. O texto sugere a ampliação do atendimento na rede.

Confira todas as recomendações da CPI

Pelo diagnóstico da pesquisadora e advogada Gabriela Rondon, da Anis – Instituto de Bioética, é preciso reforço no serviço de aborto legal e nas etapas anteriores. O DF sofre com a falha de acesso à contracepção de emergência. Popularmente conhecida como “pílula do dia seguinte”, ela evita a necessidade da eventual interrupção de gestação.

“É preciso que esse atendimento seja feito sem estigma, de modo integral, rápido, com profissionais que entendam do tema e que possam acolher essa mulher ou menina, com o maior cuidado possível”, pontuou. Neste contexto, também é preciso capacitar os profissionais de apoio, a exemplo de recepcionistas e equipes de serviços gerais.

Em parte dos casos, o estupro foi praticado pelo companheiro ou um parente da vitima. “Essa menina, essa mulher precisa identificar que se tratou de violência. Ela precisa nomear o fenômeno como violência. É muito doloroso você identificar que sofreu violência de alguém tão próximo, que você tinha uma relação de afeto, confiança”, explicou.

A decisão é da mulher

A qualificação da equipe é crucial nestes casos. “Nesse processo de ajudá-la a compreender a situação também, acompanhá-la em um processo autônomo de decisão. Os profissionais vão acolher, orientar, mas a decisão, no fim, é dessa mulher ou menina. Ela deve ter autonomia para decidir qualquer caminho”, concluiu.

Sem acesso ao serviço pelo Sistema Único de Saúde (SUS), muitas vítimas recorrem a abortos clandestinos. “Esse é um cenário trágico. Vítimas de violência de alguma maneira não conseguiram acessar o serviço previsto em lei. Elas teriam o direito. Nessa situação são empurradas à clandestinidade, onde sofrem graves riscos”, lamentou.

Acolhimento

O relatório final também apontou medidas para acolhimento das vítimas. Segundo a pedagoga especialista em assistência social, a feminista autônoma Ádila Moura Leite, a rede pública não tem servidores efetivos qualificados e nem orçamento suficiente para acolher e monitorar os casos de violência contra a mulher.

Mesmo com medidas protetivas de urgência (MPUs) decretadas pela Justiça, agressores continuam a importunar e ameaçar as mulheres. E os servidores podem requerer o reforço das ações de proteção dessas vítimas. “Com eles, a gente consegue evitar ou minimizar o quantitativo de feminicídios quando a gente assiste as mulheres”, contou.

Ou seja, a rede pública precisa reforçar toda a cadeia de monitoramento das MPUs. A CPI analisou 90 casos de feminicídio. Destes, 53 foram tentados e 37 consumados. Entre aquelas que perderam a vida, 48,6% tinham MPUs. Por outro lado, 84,9% das sobreviventes tiveram MPUs solicitadas apenas depois da tentativa de feminicídio

Na região de Planaltina, por exemplo, há mais de 200 casos de violência aguardando atendimento. Segundo Ádila, a área tem apenas dois servidores públicos dedicados ao acolhimento dessas mulheres. “O que causa um gargalo muito grande. A gente precisa recompor o quadro e pessoal”, sugeriu.

Passe livre

A CPI também formulou um projeto de lei para assegurar o direito ao passe livre temporário para as mulheres com medidas protetivas de urgência decretadas. Muitas vítimas sofrem de dependência econômica. O objetivo em oferecer o passe livre é mitigar a evasão das vítimas na rede de atendimento e acolhimento.

A comissão sugeriu o aperfeiçoamento do aplicativo +Ônibus Brasília. A ideia é assegurar as informações reais de deslocamento dos coletivos para evitar longas esperas nas paradas de embarque. Um dos crimes de violência contra mulher responsáveis pela abertura da CPI ocorreu nesse tipo de situação.

Em setembro de 2019, a auxiliar de serviços gerais Pedrolina Silva, de 50 anos, foi atacada na parada de ônibus perto do Centro Universitário Unieuro, na L4 Sul. O agressor violentou e matou a vítima. No seu trabalho de conclusão de curso (TCC), na Universidade Católica de Brasília, Pedrolina abordou a temática sobre violência contra a mulher negra.

Parcerias

A CPI apresentou o relatório para a Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT). O Judiciário é uma das instituições mais engajadas na defesa das mulheres. A Corte vai apoiar o movimento para o fortalecimento do Prevenção Orientada à Violência Doméstica e Familiar (Provid), gerido pela Polícia Militar do DF (PMDF).

O número de feminicídios continua assustando o DF. Leidenaura Moreira Rosa da Silva, de 37 anos, foi morta com uma facada no pescoço, em 6 de junho. Fernanda Landin, 33 anos, foi morta pelo marido, com golpes de faca, na terça-feira (8/6) dentro de casa.

A violência sexual também é um flagelo. Segundo a Polícia Civil do DF (PCDF), Leandro Souza da Silva, conhecido como Baianinho, invadiu uma casa e estuprou uma adolescente de 19 anos na tarde de quarta-feira (9/6). O crime ocorreu em Sobradinho.

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