Violação de sigilo profissional e uso de provas ilícitas são algumas das violações relacionadas aos processos judiciais por aborto voluntário
Estudo traçou mapa de processos judiciais sobre aborto no Brasil entre os anos de 2012 e 2022, evidenciando graves violações de direitos contra as mulheres e as meninas. A pesquisa foi conduzida pela Anis: Instituto de Bioética.
Foram analisados 402 documentos judiciais contra 569 pessoas, coletados em 23 tribunais estaduais e 2 tribunais superiores. Foram ainda levantados 12 documentos pela Lei de Acesso à Informação de 12 estados sobre a situação de pessoas presas por aborto. Entrevistas adicionais foram realizadas com seis pessoas, sendo duas profissionais da saúde, três defensoras públicas e uma mulher criminalizada por aborto.
Os resultados encontrados são consistentes no que diz respeito às violações sistemáticas de direitos humanos em todas as etapas do processo: da busca por cuidados em serviços de saúde até o julgamento no sistema de justiça. Os principais achados de pesquisa demonstram que:
Segundo Luciana Brito, co-diretora da Anis e uma das coordenadoras da pesquisa, “há uma falsa presunção de que a lei penal do aborto não é aplicada. Na verdade, quando uma necessidade de saúde é controlada por políticas criminais, a proteção da saúde e do bem-estar de meninas, mulheres e todas as pessoas é ameaçada por práticas inquisitoriais, mesmo em espaços que deveriam ser de cuidados, como os serviços de saúde”.
A pesquisa também aponta como o uso da Suspensão Condicional do Processo (SCP) torna-se uma ferramenta de controle moral sobre o comportamento das mulheres, impondo obrigações como comparecimento mensal em juízo, restrição de circulação e vigilância sobre suas atividades.
O estudo evidencia como a criminalização do aborto impõe respostas penais a uma questão de saúde pública, agravando desigualdades, violando direitos e afastando mulheres e pessoas que gestam dos cuidados necessários. Reforça ainda a urgência de políticas públicas baseadas em evidências, que priorizem o cuidado reprodutivo e a dignidade de quem gesta. A pesquisa demonstra ainda que a lei penal do aborto tem efeitos difusos e opera para perseguir, ameaçar e punir meninas, mulheres e outras pessoas que buscam cuidados e proteções no pós-aborto, durante uma emergência obstétrica ou mesmo para aquelas vítimas de violência sexual.
Este estudo integra a campanha internacional “Poderia Ser Eu – por uma saúde sem medos”, que reúne dados sobre a criminalização do aborto no Brasil, Chile, Guatemala, Peru, República Dominicana e Uruguai.