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“Mourão, não falarás da mãe ou da avó alheia como se fosse a sua”

18 de setembro, 2018

por Debora Diniz

Publicado originalmente na Revista Marie Claire

O general da reserva Hamilton Mourão tem se feito de brasilianista, um novo título que deve acompanhar as medalhinhas de seu pijama. Em entrevista recente, citou Gilberto Freire para falar de questões raciais e o mito da democracia racial no Brasil. Quando apertado sobre as origens do argumento em “Casa Grande Senzala”, justificou-se como um pós-moderno, resmungando um “na minha leitura”. Agora, deu para se aventurar sobre relações de gênero para entender o mercado ilegal de drogas no Brasil. A mais recente tese é que “sem pai e avô, só com mãe e avó” as famílias seriam fábricas de desajustados. Desajustado seria a “mão de obra do narcotráfico”, explicou o conceito inexistente em manuais de sociologia.

Para ser um respeitável brasilianista, duas regras deveriam ser seguidas pelo general da reserva. A primeira vale não só para ele, mas para qualquer candidato nessas eleições: “não falarás da mãe ou da avó alheia como se fosse a sua”. Imagino que o general da reserva esteja falando de sua experiência familiar e dos desajustados de seu conhecimento íntimo, sejam eles os que usam armas na lei ou fora da lei. Isso seria descrito como um viés cognitivo básico – “tudo o que vejo é tudo o que existe”. Errado: o mundo é mais do que se consegue entender a partir do posto de mando em uma caserna ou da sala de jantar de sua casa.

A segunda regra é que não existe isso de “gente mulambada”, isto é, pessoa feia ou malcheirosa para se referir a outros povos ou nações. Há imigrantes, trabalhadores, pobres, nordestinos, cidadãos, eleitores, e, nesse bloco de gente anônima, há mulheres trabalhadoras abandonadas por seus maridos que criam seus filhos sozinhas, sem o suporte do Estado ou da mesma masculinidade que, hoje, as julga como responsáveis pelo crime. Não foi a “crise dos costumes” ou a “dissolução da família nuclear” que causou o tráfico de drogas no país, como disse o candidato a vice-presidente. Se as causas do mercado ilegal da droga são múltiplas e complexas para o general entender com seu autoconcedido título de brasilianista, o seu patriarcado racista é evidente até mesmo para um aspirante de sociólogo no ensino médio.

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