A Câmara Legislativa do Distrito Federal está prestes a decidir que mulheres grávidas devem ter acesso a serviços de saúde e a programas de assistência social. Não há inovação na proposta; à primeira vista, pareceria uma tentativa de focalizar políticas já existentes para futuras mães. O detalhe perverso é que o Projeto Legislativo n. 217/2015, do deputado da bancada evangélica distrital Rafael Prudente (PMDB), deixa claro que seu público-alvo são apenas as mulheres que não querem ser mães: para isso, propõe criar o Programa Distrital de Prevenção ao Aborto, Abandono de Incapaz e Administração das Casas de Apoio à Vida, que se encarregaria de casos de gravidez acidental, indesejada e decorrente de estupro.Acesso a informação sobre pré-natal, políticas de proteção social à maternidade e à infância e procedimentos de adoção é direito de mulheres. Mas aborto não é matéria de prevenção. Aborto é o resultado de uma decisão reprodutiva individual de mulheres e exige, sim, informação de qualidade e isenta de julgamento. Ao Estado, cabe prover informação e políticas sociais; às mulheres, cabe decidir. Quando o Estado pretende se adiantar à decisão reprodutiva das mulheres, não se trata de direito a informação nem de política social focalizada. É estratégia ardilosa para violar direito ao aborto legal. Estado que quer cassar direitos das mulheres não é nada novo, mas a audácia de disfarçar retrocesso com proteção sempre espanta.