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Publicado originalmente na Folha de S.Paulo
O espaço digital é um espaço que movimenta a democracia. Quem pode acessar a informação? Quem pode comentar nas páginas oficiais? As respostas a essas perguntas são sobre uma comunicação democrática que exige de todas nós a presença. Falar sobre acesso à informação é falar sobre liberdade de expressão – não iremos ficar de fora, como ficamos tantas vezes – não é demais lembrar que o voto só foi estendido para mulheres há menos de 100 anos.
Hoje somos mais de 100. Advogadas reconhecidas em diversas áreas do Direito, de todas as idades e regiões do Brasil, desde o Acre ao Rio Grande do Sul. Somos mulheres negras, indígenas, LBTs, com deficiência, que formam um grupo bem maior do que inicialmente esperávamos, mas que se engajou no tema. Entendemos a relevância política do debate na defesa de uma cidadã e assim queremos ser representadas, e que nossos representantes não se escondam nas redes sociais – afinal, nosso compromisso é com a democracia.
A ação contra o Ministro da Educação é sobre uma questão constitucional fundamental – o direito à participação política. Diz sobre o comportamento de autoridades em redes sociais na era digital e sobre todas nós. Questiona o controle político realizado pela censura arbitrária por parte de agentes do Estado: o Twitter hoje é fórum público.
A velocidade da comunicação no mundo nos exige cada vez mais o exercício de um novo olhar – é saber que Ministros, Secretários, Presidentes não se despem da autoridade do cargo que ocupam para twittar ou responder comentários nas redes. Assim é que estão obrigados a seguir os princípios da ética, da publicidade e da transparência, conforme leciona o art. 37 de nossa Constituição Federal, juntamente com o Código de Ética da Alta Administração Federal.
O Ministro da Educação criou o Twitter apenas quando assumiu o cargo no Ministério, o mesmo aconteceu com o Secretário-Geral da presidência, que justamente na semana passada criou um canal de comunicação no Twitter afirmando seguir as diretrizes do Presidente da República. Lendo as páginas que criaram, vemos que não há nada da vida privada das autoridades públicas, mas sim diversas informações sobre as ações do governo.
O novo formato de democracia participativa e alcance comunitário que se lança com as mídias sociais nos provoca ao exercício de nossa capacidade de compreensão em pensar que a internet não tem fronteiras, que ali podem haver interações diretas, e que assim todos em tese poderiam falar e serem ouvidos pelo poder. O que está em jogo na ação é sobre quem pode ou não acessar essas informações públicas.
Nesse novo formato de democracia, poderíamos traçar um pequeno paralelo, é como se de um dia para o outro o ministro impedisse certas pessoas de ir ao debate da praça pública, onde está a discursar em um palanque. Por quê? Porque têm outras crenças, ou porque discordam dele. Tal seletividade é incompatível com o exercício da publicidade e da transparência, exigido legalmente de todas as autoridades.
Essa não é a primeira ação que questiona o bloqueio em redes sociais por parte de autoridades públicas: há o caso do Presidente Trump, que em maio de 2018 recebeu a determinação de desbloquear do Twitter 7 pessoas, por constituir discriminação que violava a primeira emenda da Constituição americana. No caso do Canadá, o prefeito Jim Watson sequer precisou receber notificação judicial, pois, quando entraram com ação questionando o bloqueio, no Twitter ele mesmo, aconselhado por sua defesa, desbloqueou a todos e recomendou a seus colegas que mantivessem um alto nível de acessibilidade pública nas mídias sociais. Nos casos internacionais, houve os que ganharam e outros casos pendentes, o que mostra que a disputa está lançada.
As pessoas protegidas por essa ação são todos os brasileiros, pois o que representa resumidamente é que ninguém deve ser impedido de se comunicar com o poder, por razão política alguma. Dessa forma, nos alinha com uma perspectiva mundial de compromisso com o diálogo, com a liberdade e o pluralismo político. Sabemos que no mundo todo as mulheres têm ocupado um papel relevante na busca pela garantia do amplo debate.