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Pesquisa mostra que a priorização da saúde fetal pode estar relacionada com as elevadas taxas de mortalidade materna da COVID-19 no Brasil

7 de abril, 2022

Após entrevistar familiares de mulheres grávidas ou puérperas que morreram devido ao vírus, pesquisadoras identificaram 3 principais barreiras no acesso à saúde 

O Brasil registrou as maiores taxas de mortalidade materna devido à COVID-19, a nível mundial. Até fevereiro de 2022, havia 2.012 casos notificados de mortes maternas causadas pelo vírus. Um estudo recentemente publicado em The Lancet Regional Health – Americas e conduzido por pesquisadoras da Universidade de Brasília e Anis – Instituto de Bioética aponta algumas razões para estes números.

A equipe entrevistou familiares de 25 mulheres grávidas ou puérperas que morreram devido à COVID-19 para compreender suas experiências na busca por atenção médica. As conclusões do estudo identificaram três barreiras que impedem respostas eficazes e centradas nas mulheres em matéria de cuidados de saúde no país.

Em primeiro lugar, houve atrasos na identificação dos sintomas relacionados com a COVID-19 das mulheres grávidas e na testagem para o vírus. Os familiares mencionaram que as mulheres tiveram alta do hospital após confirmação da saúde fetal, apenas com medicamentos para aliviar os sintomas leves. Foi dito às mulheres que seus sintomas respiratórios eram “doenças da gravidez/fadiga”, “nervosismo”, “algo na sua cabeça”, e até se perguntou a algumas delas se tinham “desaprendido como ser mãe, desaprendido como é estar grávida”, ou foram encaminhadas para um psiquiatra.

A segunda barreira foi o atraso na hospitalização das mulheres após o diagnóstico da COVID-19. Quase todas foram para a mesma unidade de saúde várias vezes ou para até cinco unidades diferentes antes de serem hospitalizadas. A recusa de cuidados foi ainda mais evidente para as mulheres negras. Seus familiares relataram mais tentativas frustradas de acesso aos cuidados antes da hospitalização e práticas mais agressivas de culpar as mulheres pela infecção ou por serem negligentes em relação ao vírus.

Em terceiro lugar, houve atrasos na prestação de cuidados intensivos após a hospitalização, tais como admissão na UTI, ventilação invasiva, e indução precoce do parto. Os médicos justificaram esses atrasos com a necessidade de aguardar o desenvolvimento fetal e “a necessidade de salvar ambas as vidas”.

O estudo não afirma que estas mulheres seriam salvas se tivessem tido acesso a cuidados adequados. No entanto, mostra que, para além de uma possível incapacidade do sistema de saúde para gerir a pandemia, a priorização para salvar o feto impediu o acesso das mulheres aos melhores cuidados de saúde disponíveis. Assim, conclui que para mitigar os impactos da COVID-19 e de outras emergências de saúde pública na vida das mulheres, é urgente adotar novos modelos de cuidado centrados na mulher, incluindo a aplicação de um olhar interseccional sobre gênero para a elaboração de respostas às emergências de saúde.

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